quarta-feira, 5 de março de 2014

SÓ HÁ NOTÍCIA SE FOR MUITO RUIM _ Carlos Brickmann

 

            Hélio Gaspari costuma dizer que, nas redções, a noticia chega devagarinh, abre a porta de leve,  poe a cabeça para dentro e entra correndo para esconder-se. Se a alguém a notar, será imediatamente chutada para fora. 
            E, se a notícia for boa, suas chanches de sobrevivência são ainda menores. Notícia que o pessoal gosta é corrupção, é escândalo, é miséria, é tudo aquilo que deu errado. Nas ocasiões em que o Brasil dá certo, aí não é notícia (e não vale nem a regra de que boa notícia é o inusitado). Lugar de notícia boa é a cesta do lixo.
            Jundiaí, no interior  de São Paulo, atingiu 100% no fornecimento de água tratada e chegou muito perto disso no tratamento de esgotos (só não atingiu 100% por um problema judicial). Notícias? Só nos jornais da região, e olhe lá. A capital de São Paulo, onde o programa de água e esgoto caminha bem mas ainda está longe da universalização, ignorou o tema. O Brasil, onde água tratada e esgoto são coisas de gente rica, preferiu investigar se tem ministro comendo tapioca com cartão corporativo (tema que até vale investigação, mas não pode substituir outros assuntos de importância, que se refere à vida e à morte dos cidadãos). 
             São Caetano do Sul, na Grande São Paulo, é ainda um exemplo mais claro de que as boas notícias são desprezadas pelos meios de comunicação. De acordo com os números da respeitadíssima Fundação Seade, o índice de mortalidade infantil de  São Caetano é o menor do país; equipara-se aos da Bélgica e do Japão, quatro mortes por mil nascimentos. É índice que ocorre no primeiro mundo.
            A derrubada de índices de mortalidade infantil não oocrre, em lugar nenhum, apenas pela boa intenção da saúde: exige tempo, trabalho coordenado, que envolve planejamento, engenharia, (tratamento de esgotos e de água), meio ambiente (plantio de árvores, limpezas de rios e córregos), coleta de lixo, de preferência seletiva, assistência social ( há em São Caetano um programa tipo bolsa família, mais complexo que o federal, mantido com recursos municipais), aleitamento materno, cuidados com as gestantes, educação em sentido amplo, higiene, empregos. Envolve, o que é raro, continuidade administrativa: não é porque um prefeito éadversário do antecessor que deve abandonar seus planos. O atual prefeito José Auricchio, reeleito com 70% dos votos, tem na oposição boa parte do grupo político de seu antecessor. E daí? Neste processo todo, a cidade de 150 mil habitantes atingiu o maior Índice de Desenvolvimento Humano (IHD) do país. E, fora da região do Grande ABC, o fato foi olimpicamente ignorado pelos meios de comunicação.
             Dizem que Ribeirão Preto vai muito bem na área social (mas como encontrar dados, se não há reportagens?) E, o que aparece às vezes na TV (mais rarissimamente na imprensa escrita), a cidade se transformou em área de tecnologia de ponta no uso uso de raio lazer em auxílio a transplante. Há belas experiências de sustentabilidade ambiental no Rio Grande do Sul, há o hospital de tratamento de cancer de Barretos, há as experiências em Campinas na Unicamp em energias alternativas e cirugia de diabetes, há excelentes pesquisas em Campina Grande, na Paraiba, há um belo trabalho da Embrapa e da Escola de Agicultura Luiz de Queiroz, há acricultura irrigada de ótima qualidade no semiarido nordestino. E quem sabe, por ter sido informado pelos meios de comunicação, que as hélices dos geradores de vento da Europa são em grande parte, fabricadas no Brasil.
         Vale matéria? De vez em quando, a TV mostra, em horários alternativos, em programas especializados, alguns aspectos dessas experiências positivas. De muita coisa esse colunista tomou conhecimento ao integrar o juri do último Prêmio Esso de Jornalismo, com belíssimos materiais nos jornais da região sobre os bons fatos que também ocorrem.
                Vale matéria? Deveria valer. Mas, além da volúpia pelas más noticias, há um problema extra, que assusta pauteiros e repórteres. O medo da patrulha. Fazer matérias a favor pode dar a impressão de que há alguma coisa esquisita além da reportagem. Mas é preciso também vencer este preconceito _ ou ficaremos restritosao noticiário policial fingindo que é cobertura política.

                                                                        Carlos Brickmann _ 18/08/2009.
                                                            Observatório da imprensa _ Coluna Boas Novas